Descobrir a hora de parar
- Karoline Pereira
- 5 de jul. de 2022
- 3 min de leitura

Eu disse para mim, e para meus clientes, que eu atenderia até o dia do meu parto. Repeti isso, mais de dez vezes. Repeti isso para mim, muito mais do que dez vezes. E fui me dizendo, a cada nova semana da gestação, essa era a minha certeza. Trabalharei até o dia do meu parto.
Eu acreditei, durante a gestação toda, que eu poderia esperar até entrar em trabalho de parto. Acreditei que essa decisão caberia a minha pequena e não a mim. Contudo, precisamos mudar os planos e agora temos a nossa data. Portanto, eu sei até qual dia eu posso trabalhar.
A vida é assim mesmo, adora nos mostrar que não temos controle de nada. E ela veio mais uma vez me lembrar que eu posso desejar, planejar, mas no final, a decisão não será completamente minha, ou melhor, do jeito que eu planejei ou desejei.
Há duas semanas, me percebi numa angústia forte. Acordei daquele jeito. E era uma segunda. O que para mim, foi o melhor dia para estar muito angustiada, porque segunda, é dia da minha terapia. E eu arrastei minha segunda, passei parte dela mergulhada numa angústia, que horas se manifestava como mal humor ou completo desânimo. Eu estava completamente alheia a mim, eu estava com muita dificuldade de entrar em contato com o que eu estava vivendo.
Eu tentei me esquivar durante minha sessão. O nó na garganta era tão forte, que era difícil falar. E pensei que talvez fosse melhor nem mesmo falar… Eu margeei, fui pelas beiradas. Tateando no escuro. Com tanto medo. Muito medo. E uma tristeza me tomava na medida que eu me aproximava de mim. Eu sei que chorei. Aqueles choros sofridos, sabe. Aqueles que não temos controle das lágrimas nem dos soluços.
A ambivalência era tão grande que me deixava muito confusa. E eu percebi que eu não estava pronta ainda. Que sentia muito medo da mudança que vai acontecer. Da vida que não vai mais ser como eu a conheço. Mas acima de tudo, eu estava apavorada com o encontro com minha filha. Eu ainda não me sentia preparada para receber-la aqui fora. E perceber e falar sobre isso doeu. Doeu porque tudo o que eu mais quero é poder abraça-la e tê-la no meu colo. Então, como eu poderia estar com tanto medo de encontra-la sendo que o que mais quero é justamente encontra-la?
Eu lembro que, nessa sessão, quando eu entrei em contato com esse lugar, com o medo do nosso encontro, ela mexeu. E a minha sensação era de que ela me confortava. Senti ela se movimentando em mim com tanta doçura e delicadeza, como se fosse mesmo um carinho, um conforto. O que me fez chorar ainda mais. Como dar conta de tanto amor? Como é possível sentir tanto assim? E esse medo? Essa vontade absurda de conhecer alguém que vive 24h dentro de você, mas que ainda não podemos nos olhar?
Foi a partir dessa sessão que eu compreendi. Eu precisava parar. Eu precisava de um tempo para mim, para me preparar para nosso encontro. Eu não poderia mais trabalhar até o dia do meu parto, porque eu preciso de tempo. Preciso de um tempo para nossa separação e para nosso encontro. Eu achei que eu conseguiria, e até acho mesmo que consigo, mas eu compreendi que eu posso me dar esse tempo. Eu não preciso trabalhar até o dia do parto.
Hoje, é meu último dia de trabalho. Eu já tirei da minha agenda os compromissos que eram recorrentes. Olhar para minha agenda e ve-la completamente vazia, foi muito difícil. Eu sei que meus dias serão bastante atarefados e que serei tomada por uma nova rotina, que eu não tenho nenhuma noção de como iremos vivê-la. Abri mão do controle, da expectativa ou da fantasia de que será de x jeito. A minha agenda vazia é na verdade o espaço. O espaço que eu precisava abrir para que uma nova vida possa ocupar. E não só a vida da nossa bebê. Mas a nova vida que precisaremos construir com a chegada dela nessa casa.
A agenda de hoje, estava lotada. E eu acreditei que a cumpriria como sempre cumpri. Mas, a vida, imprevisível como ela sempre é, me mostrou que é preciso parar. Clientes desmarcaram. E eu entendi a mensagem. Não há mais tanta energia aqui para o trabalho. É preciso reconhecer que há momentos em que podemos parar. E estou entendendo agora. Uma pausa. Um espaço em branco na agenda. Abertura para uma vida nova se construir. Não sei se estou preparada, mas já não sinto medo do encontro. Já estou pronta para receber a minha menina. O resto, é só uma pausa. Uma agenda em branco. Uma abertura. Em breve, retomo as minhas atividades, da melhor forma possível…





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