Parto e Amamentação - Um relato real
- Karoline Pereira
- 12 de nov. de 2024
- 5 min de leitura
Atualizado: 19 de nov. de 2024
Foi a minha primeira gestação. Logo que recebi o positivo, iniciei os estudos. Comprei muitos livros. Muitos mesmo. Comprei cursos também. Consumi muito conteúdo no Instagram. Ouvi relatos de mães (muito grata as minhas clientes mães, que muito me ensinaram sem nem saber que me ensinavam). Eu fiz tudo que eu achei que poderia fazer para me preparar. Afinal, informação é tudo, é a maior e melhor ferramenta para enfrentar as possíveis violações e interferências negativas ao longo da gestação e posteriormente, no maternar.
E eu acreditei que as coisas sairiam como eu esperava, afinal, estava muito bem informada, obrigada.
A primeira frustração veio com o diagnóstico de acretismo placentário. Com o diagnóstico, veio a notícia de uma cesária, não só isso, mas, a possibilidade de perder o útero, dependendo do nível do acretismo. As primeiras lágrimas escorreram sem que eu pudesse conter. E não foi pelo útero, mas pela impossibilidade, ou melhor, altíssimo risco de vida (minha vida) se optasse por um parto vaginal. E eu queria muito o parto vaginal.
Gastei horas de terapia e muitas lágrimas para me conformar que o parto seria uma cesária. Me vi tomada por medo e tristeza. Eu não queria uma cirurgia e eu não queria uma data. Eu queria o trabalho de parto, eu queria que a Olívia decidisse quando ela estaria pronta para vir ao mundo. Eu queria. Era isso que eu tanto queria e o que tanto li no início da gestação. Eu estava muito pronta para brigar para ter meu parto do jeito que eu queria. Mas não foi como eu queria.
Nosso parto foi lindo. Eu fui muito bem cuidada, a equipe foi maravilhosa e muito humana. Apesar de ser uma cirugia, Olívia veio direto para meus braços, corpo no corpo, até hoje me lembro de me espantar com seu cheiro delicioso. Nossa família estava toda lá, esperando para conhecê-la. Não foi o parto que eu queria, mas foi o parto que tivemos. Minha filha e eu, ficamos bem e não tivemos nenhuma intercorrência.
A segunda frustração, me atrevo a dizer, a mais dolorosa de todas, foi a amamentação. Eu queria muito amamentar. Mais uma vez: eu estudei muito sobre amamentação. Estudei pega, estudei possíveis problemas e dificuldades na amamentação. Eu tinha contato de consultoras, porque todo mundo disse que é muito difícil. E eu me preparei. Mas eu me preparei para o sucesso, não tinha espaço para o “não deu certo”.
Afinal, tudo que eu li e estudei repetia a mesma coisa: “Nada impede uma mulher de amamentar, exceto a indústria farmacêutica”. “Seu corpo é perfeito”. “Amamentar fortalece o vínculo”. “O leite materno é o melhor alimento para seu bebê”.
Ainda na maternidade, eu fui cheia de orgulho de mim mesma, posicionar minha pequena recém chegada filha. Fiz do jeito que aprendi. Segui todos os passos e até uma dose de intuição pareceu brotar dentro de mim. Quando a vi em meu peito, pensei: vai dar certo. Ela mamou brevemente, logo não quis mais. Achei que pudesse estar satisfeita, depois tentaríamos de novo e de novo, até o dia que eu compreendesse que poderíamos desmamar.
Segunda tentativa, não tão bonita assim. Choro estridente, muitas tentativas e uma bebê bastante inquieta. Parecia pegar, mas logo soltava. Eu comecei a perceber que não seria assim tão fácil. As enfermeiras, carinhosas, tentavam ajustar posição e pega. E a minha filha, chorando a plenos pulmões. Por fim, veio a sugestão do bico de silicone, deu certo. Ela mamou e se acalmou. E não se enganem, eu fiquei apavorada, porque eu já sabia que poderia causar confusão de bicos (aqui a informação passou a ser mais um fator de angústia e culpa). Por outro lado, foi o que me permitiu experimentar, mesmo que brevemente, a amamentação.
Logo veio, perda de peso, queda de glicemia, icterícia, banho de luz. Vamos complementar com fórmula. Ela não pega o peito, ou não consegue extrair o suficiente para se nutrir, afinal, tem um bico artificial ali. Enquanto estava na maternidade, foi no copo. Em casa, não conseguimos o copo. Chegou a mamadeira. E eu, chorei. Chorei porque sabia que estava indo para um caminho sem volta. Ela não iria mais pegar o peito, eu já sabia.
Quando voltamos para casa, chamei as consultoras. Uma me ajudou a cuidar dos meus seios, que estavam empedrando e começando a ter fissuras. Mas não me ajudou a desenvolver uma estratégia para retirar os bicos. A outra, ela cuidou do meu coração e das minhas expectativas. Me explicou uma série de coisas, mas acima de tudo, me olhou e me falou as coisas que eu precisava ouvir. Ela me deu uma estratégia pra retirar os bicos. Quando ela foi embora, eu sabia. Eu sabia que logo, Olívia estaria mamando apenas na mamadeira.
Eu escrevi parte desse texto enquanto tirava leite. Leite que ofereci para minha filha em uma mamadeira. A mesma mamadeira que oferecemos a fórmula. A mesma fórmula que nos acalmou quando percebemos que ela estava se nutrindo melhor. E esse caminho todo, me fez derramar muitas lágrimas. Me fez conversar com outras mães.
Me obrigou a encarar as minha idealizações e enfrentar a minha realidade.
A realidade é que não conseguimos, não por falta de leite, eu tinha bastante. Eu não consegui amamentar. Eu tinha me preparado para amamentar em livre demanda, mas não aconteceu. E eu ainda me pergunto: qual foi o momento em que fracassei?
Levou mais de um ano para eu conseguir falar sobre amamentação sem sentir um nó na garganta, sem sentir que eu perdi algo muito especial com minha filha. Sim, não era só sobre o leite materno ser o melhor alimento para um bebê. Era o que todos, de todos os cursos e materiais que li, falavam sobre o vínculo. Eu li e construí uma ideia quase mística em cima daquilo. Como se ao não amamentar minha filha, eu perdi algo que outras mães que amamentaram tiveram. E isso, me assombrou por mais de um ano.
Lá, no começo, uma amiga me disse algo que foi fundamental no meu processo de aceitar que não amamentaria minha filha como eu desejava. Ela me disse: “ela está brava, mas não por fome e sim porque ela não quer ter trabalho para mamar e você está insistindo em dar o peito enquanto ela só queria mamar tranquila na mamadeira”.

Isso, virou uma chave dentro de mim. Minha filha mama fórmula e leite materno (que eu dei até não ter mais). Nossa relação foi se construindo no colo, nas noites em que precisávamos dormir com ela no colo, porque ela não dormia em outro lugar. Precisei ouvir da minha terapeuta que Olívia se conforta não no peito, mas no colo. Essa é a nossa relação. Muito colo, o dia todo de colo. A noite juntas. Revezando entre as duas mães. Olívia dormia com as mães velando seu sono. Não tem peito, mas teve muito colo e pele a pele. Assim, fomos construindo nossa relação, vínculo e amor.
Foi um processo doloroso. Precisei de muito tempo e de apoio para poder abrir mão das minhas idealizações. Eu não suportava abrir o Instagram em Agosto, mês da Amamentação. Até hoje, evito. Resquícios das minhas expectativas e de muita idealização. Eu me muni de muita informação, de ordem prática, objetiva. Mas me faltou vivências, relatos de experiências de outras mulheres. Me faltou relações. A maternidade é solitária, mas só entendemos o que significa isso quando estamos vivendo na pele. Foi através de relações, com minha terapeuta e com minha amiga, que é mãe também, que fui capaz de cuidar das minhas frustrações.
Eu não sei se você atravessou a amamentação com tranquilidade ou não. Ou se ainda está para iniciar essa jornada, quem sabe para encerra-la... O fato é que muitas vezes ficamos presas em nossas expectativas ou idealizações sobre como deveria ser ou ter sido. E é aqui que o sofrimento nos atravessa de forma muito única. Se você achar que precisa de apoio ou alguém para escutar, eu estou por aqui. Um abraço!






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